Para abrir o tempo em pedaços grandes, e encontrar partes que ficaram eclipsadas de outras margens esquecidas, em lugares de névoa.
Lugares onde a razão foi a passeio e não voltou. Lugares como sonhos loucos desviados de qualquer improviso. A sombra na hora morta que fala sem que ninguém ouça, a fuligem no arbusto, o lugar onde o tempo parou para dizer uma palavra sem significado.
Todos viram e quiseram encontrar a ponte sobre o sempre. Sobre o lugar onde tudo dizia algo ao mesmo tempo. E sorrimos como filhos de ninguém, sorrimos como crianças dizendo asneiras no final da tarde. A ponte estava pronta esperando que alguém cruzasse. Era possível decidir com intento forte e rápido para encontrar novas realidades. Quisemos e de alguma forma conquistamos o direito de estar aqui, com o pensamento a vagar sobre tantos devaneios que não importa a quem quiser observar, ou analisar, ou dizer com cunho redobrado, para interferir. Nossa vontade é muito mais que essa brisa que sopra folhas, ou como as moscas que insistem em banquetear-se com cadáveres. Somos a vontade resistente dos caçadores de mitos, as forças permanecem ao nosso dispor esperando para serem usadas.
E corre no campo o elemental reluzente com seu rastro de pequenas estrelas. Não podemos desistir, é o que dizem, e nisto a mente esvoaça tentando resistir ao final para que possa encontrar a parte esquecida, a parte que faria alguma diferença, a parte que diria algo além das notórias idéias repetidas que nos perseguem a cada dia. E é possível encontrar um ponto de mutação. Uma maneira de burlar a consciência para então partir sobre despenhadeiros distantes, num galope fácil, encontrando criaturas estranhas. Nossa vida precisa desse cunho épico para que possamos nos erguer novamente, e limpando os olhos perceber que conseguimos penetrar muito fundo nos domínios do inconsciente, e fazer uma leitura completa do imaginário. Disseram alguns que isto seria a forma mais precisa para se colocar uma faca no coração da força sombria que obstrui os esforços dos iluminados. Nós continuaremos querendo, então, e nesse querer deixaremos gravada a marca que sobrevive ao tempo, pois foi indelevelmente gravada em nossa árvore da vida. Nós passaremos, nós pousaremos nesses campos longínquos dizendo verdades novas, e nos sentiremos imensamente saciados por esta intelectualidade. Num dado momento o espírito precisa ver estas forças se manifestarem. Precisa ver acontecer esta capacidade para dizer o que seria a fonte de uma nova juventude. Sorrir com este poder, relembrar os verdes anos, onde uma onda de euforia nos dizia tantas alegrias breves que se repartiam como doces numa loja de alucinações, mas que se faziam reais ao toque da língua, com sua açucarada e proverbial beleza, para que uma criatura pudesse descansar no abrigo mágico dos domínios do espírito.
EU SOU ESTA FONTE MÁGICA BROTANDO DOS MEUS DEDOS. Eu sou esta doce reviravolta que me faz sorrir enquanto tenho a certeza de que tudo passa, e poderei encontrar novamente quem sou me esperando no fim do corredor, com um tabuleiro de xadrez e sorrindo, para que possamos caminhar no chão de ladrilhos brancos e pretos. É preciso ter muita paciência nesta onda de imaginação que quer tocar sua parte ausente do outro lado. É preciso perseguir isto como um cão perseguindo galinhas no terreiro. Por pura brincadeira de existir, com a língua de fora e sorrindo em seus ávidos olhos. Não teremos assim que viver perseguindo o passado, só desfrutar essa doce e apaziguante hora em que ficamos ao abrigo de tudo. E pode dar uma certa tonteira essa onda de criação, uma certa vertigem essa vontade de voar. Nos sóis de mundos distantes iremos encontrar aquilo que fazia falta desde o início. No tempo que se faz fuligem, nas horas em que não sabemos, como nada mais além dos que ficaram para trás numa ruína abandonada esperando a chegada do exército inimigo. Mas passaremos por isto. Passaremos brincando e sorrindo para iludir as horas. São sempre seres com cara de duende que olham para nós a perguntar o que estamos fazendo. Mas isto é porque estamos conseguindo colocar a ponta da visão no local onde eles realmente existem e nos observam com olhar incrédulo, como a dizer que não seria possível esta inventividade.
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